Amlia Rodrigues — Autogénese

[Intro: Natália Correia] Autogénese [Verso 1: Natália Correia] Nascitura estava Sem faca nos dentes Cómoda e impura De não ter vontade De bater nas gentes [Verso 2: Natália Correia] Nasce-se em setúbal Nasce-se em pequim Eu sou dos açores (relativamente Naquilo que tenho De basalto e flores) Mas não é assim: A gente só nasce Quando somos nós Que temos as dores; [Verso 3: Natália Correia] Pragas e castigos Foram-me gerando Por trás dos postigos E um fórceps de raiva Me arrancou toda Em sangue de mim [Verso 4: Natália Correia] Nascitura estava Sorria e jantava E um beijo me deste Tu Pedro ou Silvestre Turvo namorado Do verão ou de outono Hibernal afecto Casca azul do sono Sem unhas do feto [Verso 5: Natália Correia] Eu nasci das balas Eu cresci das setas Que em prendas de sala Me foram jogando Os mulheres poetas Eu nasci dos seios Dores que me cresceram Pomos do ciúme Dos que os não comeram; [Verso 6: Natália Correia] Nasci de me verem Sempre de soslaio De eu dizer em junho E eles em maio De ser como eles às vezes por fora Mas nunca por dentro Perfil de uma estátua Que não sou de frente [Verso 7: Natália Correia] Nascitura estava E mais que imperfeita De ser sorte ou dado Que qualquer mão deita [Verso 8: Natália Correia] Eu nasci de haver Os bairros da lata Do dedo que escapa Dos sapatos rotos Da fome que mata O que quer nascer E que o sábio guarda Em frascos de abortos; [Verso 9: Natália Correia] Eu nasci de ver Cheirar e ouvir Dum odor a mortos (judeus enlatados Para caberem mais Mas desinfectados) Pelas chaminés Nazis a sair De te ver passar De me despedir De teus olhos tristes Como se existisses Nascitura estava Tom de rosa pulcra Eu me declinava Vésper em latim: Impura de todos Gostarem de mim


Other Amlia Rodrigues songs:
all Amlia Rodrigues songs all songs from 1970